Em uma semana, Lava Jato colhe três derrotas com Gleisi, fim da coerção e delações da PF
Supremo impôs reveses à força tarefa que, após quatro anos, vê seu poder questionado. Decisões aumentam expectativa sobre julgamento de novo 'habeas corpus' de Lula
São Paulo
Sessão da Segunda Turma do STF na terça-feira 19 de junho. NELSON JR. SCO/STF
"Viva Gleisi! Agora, é liberdade pro Lula! Lula Livre", celebrou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) em vídeo publicado em seus perfis nas redes sociais após o Supremo Tribunal Federal (STF) inocentar a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo, da acusação de ter praticado os crimes de lavagem de dinheiro e corrupção passiva. A senadora petista ainda é alvo de um inquérito e duas outras denúncias no STF, mas a extinção de um dos processos animou os petistas para a próxima semana, quando a Segunda Turma do STF, a mesma que absolveu Gleisi, julga novo pedido de habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Pode não haver motivos concretos para o otimismo do senador no caso particular de Lula, mas o certo é que o clima não está mesmo nada bom no Supremo para a Lava Jato.
Nos últimos seis dias, o STF tomou outras duas decisões que contrariam posições defendidas pelos procuradores da operação. Na semana passada, a maioria do plenário definiu que as conduções coercitivas não podem ser usadas para tomar interrogatórios, como foi feito como o ex-presidente Lula entre outras 227 vezes ao longo da operação. Nesta terça-feira, os ministros decidiram que a Polícia Federal pode fechar acordos de delação premiada, contrariando pedido da Procuradoria Geral da República. Na avaliação dos procuradores, partilhar essa prerrogativa com a PF enfraquece o Ministério Público Federal (MPF), responsável por fechar a grande maioria das delações até agora — a PF fechou acordo com o ex-ministro Antonio Palocci, o publicitário Duda Mendonça e o empresário Marcos Valério; todas aguardam homologação da Justiça. Além disso, as competências se confundem: a PF pode firmar o acordo sem o aval do MPF, mas os procuradores podem denunciar o acusado que fez o acordo com a polícia. De qualquer forma, cai o monopólio da prerrogativa de fechar os acordos.
Após a decisão, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) publicou uma nota para colocar panos quentes na questão. “Não haveria porque retirar da Polícia Federal um dos mais importantes instrumentos de investigação, expressamente previsto pelo legislador. Agora não existem mais motivos para haver rusgas entre as instituições nesse sentido. O Supremo deixou claro: o delegado de polícia celebra o acordo, o Ministério Público opina e o Judiciário decide", disse o presidente da ADPF, Edvandir Felix de Paiva.
Não bastassem as recentes derrotas, alguns dos ministros — em especial Gilmar Mendes — não poupam críticas às investigação durante os julgamentos. “Vou votar pela absolvição [de Gleisi Hoffmann] pela falta de provas suficientes para condenação. O caso foi estruturado apenas no depoimento de vários delatores, que se contradizem. O reforço de provas materiais é raquítico e inconclusivo. A presunção de inocência impõe à acusação o ônus de comprovar as acusações”, disse Mendes na sessão de terça-feira da Segunda Turma. Não é a primeira vez que as acusações de delações são consideradas frágeis: de acordo com números da Agência Brasil, 25 políticos acusados em delações tiveram as investigações contra eles suspensas ou arquivadas nos tribunais superiores, incluindo o caso de Gleisi e do marido.
A maré contra a Lava Jato no Supremo, que é ainda mais forte na Segunda Turma — composta por Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello, Gilmar Mendes e Dias Toffoli — animou os petistas para o julgamento de mais um pedido de liberdade de Lula, marcado para a próxima terça-feira. Em carta divulgada por Lindbergh após a absolvição de Gleisi, Lula diz que "pela primeira vez o STF reagiu claramente diante da indústria das delações em um caso concreto, desmoralizando o discurso e a prática da Lava Jato". Não está claro, contudo, se o novo pedido de habeas corpus de Lula será aceito desta vez.
O pedido de liberdade é parecido com o outro que já foi negado pelo plenário do STF, o que joga contra ele. A diferença, agora, é que o pleito foi enviado para julgamento da Segunda Turma, onde a maioria tem perfil garantista. Apelidada jocosamente de "Jardim do Éden", a Segunda Turma tem tomado decisões favoráveis a investigados, principalmente no que diz respeito a pedidos de habeas corpus. Levantamento do jornal O Estado de S.Paulo mostrou que de 2015 a 2017 a Primeira Turma do STF foi favorável total ou parcialmente a 16% dos pedidos de habeas corpus que julgou, enquanto a Segunda decidiu em favor do réu em 40% dos casos. Foram os ministros dessa turma, aliás, que tiraram das mãos de Sérgio Moro parte da delação da Odebrecht que dizia respeito a Lula.
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