Bolsonaro x Bebianno, os áudios que expõem perigosamente o Governo
'Veja' publica os áudios de conversa do ex-ministro e presidente, contradiz versão de Carlos sobre ausência de comunicação e mostra um núcleo político ainda mais frágil do que se pensava
São Paulo
Bebianno cumprimenta Bolsonaro no dia da posse. AGENCIA SENADO
Durou apenas algumas horas a tentativa do Governo Bolsonaro de virar a página da crise que envolveu a demissão de Gustavo Bebianno da Secretaria-Geral da Presidência da República. A primeira baixa da gestão segue em todas as manchetes após a divulgação, pela revista Veja, de áudios de WhatsApp de conversas entre o presidente e seu ex-ministro, ofuscando as agendas tidas como prioritárias pelo Planalto, como o pacote anticrime do Ministério da Justiça ou a expectativa para a reforma da Previdência nesta quarta. Nas mensagens disponíveis para a degustação do público, fica perigosamente exposto um presidente que, há menos de dois meses no cargo, desconfia de iniciativas de um aliado próximo –inclusive de seus contatos com a "inimiga" Globo–, respalda todas as atitudes de seu filho considerado mais irascível e está preocupado com a "batata quente" em que se transformou o escândalo das candidaturas-laranja de seu partido, o PSL.
Em termos factuais, os áudios revelados pela revista põem em xeque a versão dos Bolsonaro no ponto de inflexão da crise, quando o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), disse, no Twitter, que o então ministro havia mentido sobre ter conversado três vezes com seu pai pelo telefone, dando a entender, na versão da família presidencial, que havia discutido o escândalo do PSL. Depois, o próprio Bolsonaro disse na TV que não havia conversado com Bebianno, endossando a acusação de mentiroso.
A revista revela troca de mensagens que se deram aparentemente no dia em que os Bolsonaro negam a conversa. Na sequência, o agora ex-ministro tenta se defender e critica Carlos: “Capitão, há várias formas de se falar. Nós trocamos mensagens ontem três vezes ao longo do dia, capitão. (...) Qual a relevância disso, capitão?". Bebianno afirma, sem citar, que filho de Bolsonaro está agindo "com ódio". De quebra, o agora ex-ministro ainda revela reservas do poderoso núcleo militar do Governo com um então colaborador estratégico de Bolsonaro, um dos aliados mais longevos (fora da família) no arranjo do novo Governo. "O senhor se lembra que, no início, eu não podia participar daquelas reuniões de quartas-feiras, porque os generais teriam restrições contra mim?", pergunta Bebianno, que foi, nos bastidores, defendido pela ala oriunda das Forças Armadas que defendiam sua permanência.
A mapa da mídia de Bolsonaro
Todos os áudios do presidente, em conjunto, também expõem o mapa da mídia com que trabalha Bolsonaro e o Governo. O presidente acusa o então ministro de "mandar" no site O Antagonista e plantar (fazer publicar, no jargão) ali informações. E uma das desavenças centrais com Bebianno gira em torno da decisão do então ministro de receber em seu gabinete o vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo, Paulo Tonet Camargo. Bolsonaro reage, proíbe o encontro, dizendo que receber Tonet significava trazer "o inimigo para dentro de casa", e o complicaria "com as outras emissoras".
A conversa põe às claras o que já era mais ou menos conhecido. O presidente tem dado entrevistas preferencialmente à TV Record. A emissora de Edir Macêdo, concorrente da Globo, deu apoio público a Bolsonaro durante a campanha. Bolsonaro também teve encontros com Silvio Santos, do SBT, e tem se mostrado favorável à medidas que prejudicariam a Globo, líder do mercado, como o fim do BV – ou "bônus por volume", que é recebido pela agência que destina a um determinado veículo um pacote grande de publicidade e incentiva a concentração das campanhas. A família presidencial tem se mostrado ressentida com o destaque dado pela Globo ao escândalo envolvendo o senador Flávio Bolsonaro.
O Globo reagiu ao vazamento em nota: "O Grupo Globo considera que não tem nem cultiva inimigos. A própria natureza de sua atividade jamais permitiria qualquer postura em contrário", diz o texto, que afirma que Tonet buscou o Governo em "relações estritamente institucionais e republicanas".
"Macumba psicológica" e primeira derrota na Câmara
O áudio mostra também um Bolsonaro preocupado com o escândalo das candidaturas-laranja revelado pela Folha de S. Paulo, que envolve candidatas do PSL em Pernambuco e Minas Gerais. “Querer empurrar essa batata quente desse dinheiro lá pra candidata em Pernambuco pro meu colo, aí não vai dar certo. Aí é desonestidade e falta de caráter", reclama Bolsonaro. Bebianno retruca dizendo que nada nos Estados eram de sua responsabilidade e avalia que o presidente foi “bem envenenado” contra ele.
Após a divulgação, Bebianno começou a falar com a imprensa –concendeu entrevista ao vivo à rádio Jovem Pan–, numa sinalização que não vai querer submergir tão rápido. "Carlos Bolsonaro vive dentro de teorias conspiratórias sucessivas contra o pai", fez uma "macumba psicológica na cabeça do pai", disse aos jornalistas o ex-advogado de Bolsonaro, que o acompanhou desde a campanha e ganha agora a alcunha de homem-bomba potencial no meio políticos.
Nesta quarta, Bolsonaro fará uma nova tentativa de virar a página. Pretende retomar o protagonismo positivo levando pessoalmente a proposta de reforma da Previdência à Câmara pela manhã. Teve um aperitivo algo amargo, no entanto. Em sessão nesta terça, o plenário derrubou um controverso decreto do Governo que ampliou o rol de pessoas autorizadas a classificar documentos secretos e ultrassecretos. O texto ainda tem que passar pelo Senado.
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