Manaus testemunha a 'hora da morte’ por covid-19. “As pessoas morrem sozinhas. Sozinhas, sozinhas, sozinhas.”

A médica Uildeia Galvão atua em condições precárias no PS 28 de agosto, na capital do Amazonas, um retrato do colapso que se espalha pelo Brasil

JOSETTE GOULART

São Paulo - 01 MAY 2020 - 17:28 ART

A médica Uildéia Galvão trabalha 12 horas por dia, todos os dias. Às vezes, sua jornada chega a 20 horas, para dar conta dos pacientes que chegam ao Pronto Socorro 28 de agosto, em Manaus, com sintomas da covid-19. “Os pacientes que têm a doença sentem muita sede. Tem momento que eles querem muita água. E aí você vê o paciente pedindo água e… você não pode, você não consegue, você está entubando alguém, vendo um outro paciente mais grave. E não tem ninguém para dar essa assistência para esse paciente”, conta a profissional, na reportagem de Josette Goulart. “É difícil ver pessoas morrerem sozinhas. Sozinhas, sozinhas, sozinhas.” A capital do Amazonas é uma das mais afetadas no Brasil pela crise do coronavírus, que, segundo dados desta sexta-feira, já deixou 6.329 mortos no país e infectou 91.589 pessoas.

As histórias no Estado são as mais impactantes desta pandemia: superlotação em hospitais, avalanche de corpos nos cemitérios, centenas de doentes que não conseguem, sequer, entrar em uma unidade de saúde e acabam morrendo em casa. Na medida em que as mortes escalam, é no Amazonas, justamente, que a covid-19 pode fazer suas primeiras vítimas políticas: o governador, Wilson Lima (PSC), e o seu vice, Carlos Almeida (PTB), terão que enfrentar um processo de impeachment. Nesta sexta, a Assembleia Legislativa do Estado aceitou dois pedidos, que afirmam que o Governo local tem feito uma má gestão no combate à disseminação da doença e acusam os mandatários de crimes de responsabilidade. O sistema de saúde do Estado está em vias de colapsar.

Enquanto isso, a equipe do biólogo Gustavo Cabral trabalha incessantemente no desenvolvimento de uma vacina brasileira contra a doença. Cabral, que é especialista em imunologia, conversou com a repórter Joana Oliveira sobre a pandemia de coronavírus e a importância de investimentos em ciência. “Se o coronavírus causou tanto estrago em países de primeiro mundo, com melhores estruturas sociais e econômicas, o que vai fazer quando adentrar fortemente as comunidades mais vulneráveis do Brasil, os interiores, as favelas? Quando vejo pessoas na rua, penso nos mais vulneráveis e me pergunto se elas não têm empatia”, diz.