As cinco horas da queda de braço no Supremo que quase libertou Lula
Às vésperas do recesso, STF vive momentos de tensão após o Marco Aurélio Mello conceder liminar, depois revogada, para soltar presos julgados em segunda instância, o que beneficiaria o ex-presidente
Brasília
O ministro Marco Aurélio em abril deste ano. ADRIANO MACHADO (REUTERS) / VÍDEO: REUTERS-QUALITY
O presidente do Supremo Tribunal Federal, José Antonio Dias Toffoli, acabara de ter um amistoso almoço de fim de ano com seis de seus colegas de Corte quando foi surpreendido por uma decisão do ministro Marco Aurélio Mello, que determinava libertação de todos os presos do país que não foram julgados após a segunda instância. A medida contemplaria o preso mais famoso do país, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, detido em Curitiba desde abril. A calmaria pré-recesso do Judiciário chegava ao fim. Nas próximas horas, a pressão sobre Toffoli aumentaria. E, em brevíssimo tempo, ele precisaria tomar uma decisão que poderia convulsionar o país: manteria a liminar e enfureceria milhares de anti-petistas ou a revogaria, revoltando os apoiadores de Lula? Ao longo das próximas 5 horas, aconteceriam manifestações de ambos os lados. Um grupo já se aglomerava do lado de fora da Corte.
O furacão que atingia um calmo Supremo em seu último dia útil do ano era o sinal de que a paciência de Marco Aurélio Mello havia chegado ao fim. Desde abril ele reclama que o seu voto de relator sobre a prisão de condenados em segunda instância está pronto para ser levado ao Plenário —mas nem Cármen Lúcia, nem Dias Toffoli (presidentes da Corte no período), o colocaram para a análise do colegiado de forma célere. Ela já havia, inclusive, externado sua irritação publicamente, ao enviar recados pela imprensa à Cármen Lúcia, então presidente da Corte, que afirmava que não colocaria as ações sobre o tema em votação porque ele já estava pacificado desde 2016. “Pacificado como? Existem duas ações declaratórias em curso e a matéria está pacificada?”, discordava o ministro. Por isso, às exatas 14h, ele decidiu agir por conta própria. Concedeu a polêmica liminar.
Nos corredores do prédio, os burburinhos de funcionários que não esperavam qualquer emoção de última hora se ampliavam. Três servidores que se encontraram próximo a um cafezinho faziam piada sobre o assunto. “A mensagem que mais circula no grupo de WhatsApp dos juízes é: ninguém solta a algema de ninguém”, dizia um desses funcionários, em alusão ao bordão "ninguém solta a mão de ninguém", que se espalhou entre os contrários a Jair Bolsonaro após a eleição. Enquanto a Corte enfrentava internamente o problema, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se reunia com sua equipe para decidir como recorreria da decisão. E, em Curitiba, os advogados de Lula, que também se surpreenderam com a potencial benesse, ingressavam às pressas com o pedido de liberdade. Queriam que o ex-presidente comemorasse o Natal em casa.
Longe dos holofotes, o restante do Judiciário do país vivia um efeito cascata: dezenas de magistrados começaram a receber pedidos de soltura de presos que ainda não haviam sido condenados em última instância. O próprio STF recebeu um novo pedido de liberdade, o do empreiteiro Sérgio Mendes, dono da construtora Mendes Júnior, também preso pela Lava Jato.
Às 19h39, Toffoli, por fim, colocou fim ao suspense. Optou por cassar a liminar e, entre outros argumentos, alegou que pretendia evitar “grave lesão à ordem e à segurança públicas”. Em um jargão futebolístico, pegou a bola e a colocou novamente no centro do campo. O presidente do STF, que prega um discurso conciliatório diante do duro momento de acirramento político enfrentado pelo país, decidiu ainda que o tema só voltará à pauta em abril de 2019, como já estava planejado antes da ação de Marco Aurélio.
Pela segunda vez no ano, a possibilidade de libertar Lula mobilizou as atenções de boa parte do país. Na porta da carceragem em Curitiba, onde ele está preso, seus apoiadores se reuniam, na expectativa de vê-lo livre ainda nesta quarta. Também foi assim, em julho, quando uma decisão monocrática do desembargador Rogério Favreto, que libertava o petista, precisou ser revista por outros três magistrados, até que fosse revogada. Tanto da outra vez como desta, o ex-presidente, retirado da corrida eleitoral de outubro por conta da condenação que o colocou na cadeia, foi mantido na prisão. Quando a decisão de Toffoli saiu, seus apoiadores se frustraram novamente. Já do lado de fora do Supremo, aplausos, gritos e fogos de artifício. E diante da confusão, uma imagem em laser projetada nas paredes condenava a Corte “O Supremo é uma vergonha”.
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